AS REDES SOCIAIS E
O DIREITO DIGITAL
Em
tempos de uma verdadeira explosão digital, o palco do Direito ganha contornos diferenciados
e cores mais vibrantes, descortinando um novo cenário de relações
interpessoais, onde a máquina passa a ser uma importante testemunha nas novas ações que já saltam da
virtualidade para o mundo real.
É
o direito digital ganhando forma e corpo.
Estamos
na era da informática. Nunca o mundo se comunicou de forma tão rápida, tão
imediata, como nos tempos atuais. A cada
instante surgem novas redes sociais que se alastram com uma velocidade
vertiginosa e possibilitam não só o contato de pessoas de todo o mundo, como
também a mais liberal divulgação de ideias.
Há
uma verdadeira teia de informações conectando, em tempo real, o mundo inteiro,
numa simbiose impressionante de conhecimentos. Há solidões se encontrando, ideologias se confrontando, ideias e ideais se disseminando.
Mas,
neste nosso universo estritamente humano,
esse democrático meio de
comunicação está longe de ser perfeito. E o direito à liberdade de expressão
vem sendo confrontado, irremediavelmente, com ofensas à honra alheia, porque, afinal,
o nosso direito termina onde começa o direito do outro.
Como
dispõe o art.186 do Código Civil em vigor, “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
No
entanto, a consciência ética ainda é uma utopia e já se delineiam no universo
trabalhista, inúmeras ações que têm por pano de fundo o denominado direito
digital.
Recentemente, uma ex-empregada de um restaurante foi
condenada por dano moral. Ela convidava, em um site de relacionamento, todos os
que haviam sido “escravos” do Restaurante em que havia trabalhado, com o
intuito de atacar os sócios do estabelecimento, inclusive alegando a suposta
homossexualidade do filho de um deles. A
empresa entrou com ação por danos morais e ganhou em primeira e segunda
instâncias, tendo sido a ex-empregada condenada a pagar uma indenização de 1.000,00
aos sócios, em virtude do dano moral.
Se
ela estava ressentida, usou mal sua mágoa. Quis vingar-se e o fez de uma forma
que lhe retornou como um bumerangue, agravando ainda mais a situação.
É
preciso lembrar, também, que uma indevida publicação na internet poderá causar
retaliações e, inclusive, ser razão para a aplicação de uma justa causa. Reza o art. 482 da C.L.T. em
sua letra “k” que “Constitui justa causa para rescisão do contrato de trabalho
pelo empregador.(.....) k –o ato lesivo
da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e
superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de
outrem.
Também
há a hipótese de o empregado se utilizar, para práticas indevidas, dos meios
fornecidos pela empresa exclusivamente para trabalho. Tem-se visto situações de
empregados que usam a internet do trabalho para visitar sites pornográficos,
por exemplo, ou para manter contato com namorada ou marido, em horário de
trabalho. Nestas hipóteses, o empregador poderá despedir por justa causa,
utilizando-se do mesmo art. 482, da CLT, alíneas “b”, (que se refere a
incontinência de conduta ou mau procedimento) ou “h”, (que se refere a ato de
indisciplina ou de insubordinação), caso a proibição de utilização do meio
eletrônico para fins outros seja vedada em contrato ou acordo/convenção
coletiva.
Até
certo tempo atrás, as ferramentas de serviço eram, na regra geral, fornecidas
pelos empregadores no próprio ambiente de trabalho, o que limitava sua
utilização.
Hoje,
com a disseminação dos notebooks, tablets, celulares e outras tecnologias de
ponta, algumas vezes de propriedade do próprio empregado, a situação mudou. Daí nasce a necessidade de o empregado estar
mais atento ao que escreve, porque a palavra escrita pode ser interpretada e
entendida de inúmeras formas.
Defende-se
a tese genérica de que a liberdade de expressão há de ser ilimitada. Mas não é bem assim que funciona na prática.
Tudo o que se diz deve ter, no mínimo, determinados parâmetros, para que a fala não se torne invasiva,
agressiva, imoral, perturbadora ou violadora da liberdade do outro.
Indo
ao extremo das hipóteses, sabe-se que estes meios têm sido usados,
indevidamente, inclusive por pedófilos, voyeurs, e para outros tantos objetivos escusos, o que
ultrapassa certamente as fronteiras do direito do trabalho para enveredar pela
senda Penal.
E
há outros se utilizando desse meio não só para difamar, mas também corromper, aliciar,
denegrir, se vingar.... ou, simplesmente,
se exibir, sem pensar nos desdobramentos que esse comportamento pode vir
a ter.
Vê-se,
facilmente, no entanto, que a rede
social, mal utilizada, pode levar a condenações por dano moral, a dispensas por
justa causa e até a punições mais graves.
Mas
ainda há um outro lado, que os maus usuários dessas redes talvez não se deem
conta: é de que, através desse estupendo universo da comunicação, nasceu uma
nova identidade: a identidade digital! Imediata,
acessível, aberta e inquestionável,
porque autobiográfica: o perfil e o comportamento das pessoas que se
encontram expostos nas redes sociais tornaram-se, hoje, um novo critério até
mesmo de processos seletivos, conforme já vem ocorrendo em alguns países.
Nos
Estados Unidos e no Reino Unido, atualmente, os gerentes de Recursos Humanos
das grandes empresas já se utilizam dessa pesquisa como importante elemento de
escolha do candidato. As pessoas,
contudo, ainda não se deram conta dessa sua nova identidade.
Consoante
publicação no boletim TST (www.tst.jus.br/materias-especiais/-/asset-published/89/Dk/contente/uso-de-redes-sociais-repercute-no-ambiente-de-trabalho),
foi divulgado que cerca de 60% de jovens que participaram de pesquisa realizada
pela AVG Technologies afirmaram que nunca revisaram seus perfis on-line, antes
de procurar emprego.
Em
contrapartida, cerca de 90% dos profissionais de recursos humanos consultados
revelaram pesquisar os perfis dos seus candidatos nas redes sociais.
E
não é preciso destacar que exibicionismo com fotos de nudez, comportamento
agressivo ou discriminatório, ou críticas infundadas ao emprego anterior,
dentre outras mil opções, reduzem, senão fulminam totalmente, a chance de a
pessoa ser convocada para uma entrevista de trabalho.
A
empresa AVG, através de seu embaixador mundial Tony Anscombe, registrou numa entrevista que: “Atualmente, o conteúdo
on-line de um candidato é equivalente a uma primeira entrevista, em que a
empresa tem suas primeiras impressões. Essa pesquisa reforça que nossa
identidade digital pode ser tão importante quanto o currículo em algumas
situações.”
O
perfil de uma pessoa na rede pode, portanto, implementar ou impedir sua
contratação por uma empresa.
Estamos
diante de novos tempos. Novas ideias. Novas estratégias. Pode-se, hoje, instruir um processo com provas virtuais como
históricos de e-mails, conversas ou publicações nas redes sociais, ou mesmo a
troca de conteúdo pornográfico.
E
com base nesse material, pode-se dispensar por justa causa. Pode-se não
contratar. Pode-se ajuizar ação de reparação por danos morais.
O
poder empregatício decorre da livre iniciativa, que é um direito fundamental,
previsto na Constituição. Mas, por outro lado, o direito fundamental do
trabalhador ter a sua liberdade também está previsto na Constituição. Será
preciso equacionar sempre os dos lados.
Há
empregadores que impedem que seus empregados se manifestem ideológica ou
politicamente. Teoricamente, o empregador não pode fazer isso, a não ser no
âmbito do trabalho. Mas há situações
excepcionais em que a vida profissional exige certas limitações. Imagine-se uma orientadora educacional, que
trabalhe com crianças e jovens, que resolva gravar cenas eróticas e postá-las
na internet. Certamente que a repercussão será totalmente prejudicial ao seu
bom rendimento no trabalho, porquanto incompatíveis as condutas. E é nesta
senda que aparece o bom senso como norteador de condutas.
Temos
mais portas, mais janelas, mais horizontes, mas caminhos e, em contrapartida,
mais possibilidades de erro. Temos liberdade de expressão, mas também temos que
nos submeter a regras de conduta. Afinal, vivemos em sociedade. Se a liberdade
de consciência nos está assegurada no artigo 5º, incisos VI e VII da
Constituição Federal, por outro lado seu uso de forma inconsequente poderá
trazer problemas e consequências indesejáveis.
Passamos
a dispor de veículos céleres e eficazes de comunicação e temos liberdade para
que possamos expressar nossa opinião, desde que respeitadas a imagem e a honra
das pessoas.
Nas
redes sociais, o que se vê é que as próprias pessoas diminuem sua privacidade,
na medida em que expõem sua vida, postando fotos e comentários acessíveis a um
grande número de pessoas. É preciso
estar consciente, portanto, de que aquilo que se torna público pode ser
utilizado de formas nem sempre previsíveis ou controláveis.
É
preciso estar antenado. É necessário estar conectado ao mundo, mas não podemos transformar
em armas a serem disparadas contra nós mesmos
os benefícios que a tecnologia nos tem brindado a cada instante.
A
vida não retrocede e o preço que se paga pelo progresso é a surpresa, o susto
ou a hesitação que sentimos quando temos que escolher novos rumos.
Incompetência,
ingenuidade ou crença na costumeira impunidade?
Sejam quais foram as causas da má
utilização das redes sociais, essa nova realidade
que nos puxa pela mão nos impõe o contato com uma consequência inevitável: o resultado de nossas escolhas!
São
elas que definem nossa vida e nossos rumos.
Mas
há, também, o reverso da moeda. Se o usuário da rede age de boa-fé, isso também lhe poderá servir de prova. Quem
não soube do caso do famoso julgamento conhecido como “Mensalão”? A gerente
financeira Geiza Dias foi inocentada pelo teor dos e-mails que trocava com os
colegas da agência SMP&B, através dos quais foi presumida sua ingenuidade
quanto à lavagem de dinheiro.
É
de se concluir, portanto, que não é
preciso maquiar a realidade, nem se anestesiar no silêncio incômodo. Também não
precisamos temer as palavras. Elas são o palco, a música e a dança de nossa
expressão. São instrumentos do nossa pensamento, do nosso trabalho, das nossas
emoções.
Mas
podem ser transformadas em armas, se esse for o intento. E aí as consequências
deverão ser suportadas como frutos das sementes plantadas.
Nesses
tempos de vertiginosa evolução em que, como disse alguém, o bater de asas de
uma borboleta na Amazônia pode provocar um terremoto no Japão, temos que
equacionar essa relação entre liberdade e deslimite para que essa nossa liberdade de expressão, ao
invés de desvirtuar, nos reconstrua a cada dia, aprimorando dons e
talentos.
E
que nós, profissionais do Direito, possamos, mais do que curar, orientar e prevenir
as falhas que brotam dos mais arcaicos instintos da natureza humana, tendo a trilogia: ética, moralidade e bom senso como nossa parceira incansável.
LINDA
BRANDÃO DIAS
28/03/2013
Parabéns pelo Blog coloquei na lista de indicações do meu blog, seria uma honra receber sua visita, recebi a indicação do João Rodrigues Perito, também atuo na área.
ResponderExcluirhttp://periciascontabeisjudiciais.blogspot.com.br/
Assunto interessante esse!
ResponderExcluirObrigado pela visita,Linda!
Olá.
ResponderExcluirSou do Portal Teia, meu nome é Alfredo.
Simplesmente é o melhor texto sobre o assunto "liberdade de expressão em redes sociais " que já li.Parabéns.
Claro que será aceito no Portal Teia, já foi divulgada.
Fique a vontade para pedir divulgação quando quiser.
Até mais
Fantástico!
ResponderExcluirÉ este tipo de informação que deve ser veiculada nas mídias e não essa tal liberdade "democrática" tão amplamente defendida e difundida que estamos vendo por aí...numa sociedade onde a libertinagem e a falta de senso de respeito predominam, não é espantoso notar que a internet se transformou numa terra onde "tudo é possível", justamente porque os não informados pensam e agem como se, por estar detrás de um monitor, possam passar por cima dos direitos de outrem.
Não podemos permitir que isto continue.
E esta matéria veio a calhar, agora é só passar a informação adiante para ver se dá resultado e a internet venha a se tornar um local mais "sociável" e se parecer menos com trincheira de guerra.
O Direito Digital no Brasil, ainda caminha a passos lentos, na verdade,não temos leis nesse sentido. O país avançou muito rapidamente no caminho da informatização, porém as leis não acompanharam. estarei seguindo o blog
ResponderExcluirAbraço
Parabéns pelo Blog, ótima matéria para ser passada adiante e tornar a internet um local mais humanizado.
ResponderExcluirGostaria de saber se posso divulgar a matéria "As Redes Sociais e o Direito Digital" no meu Blog de variedades (agoraeusei.net) colocando os créditos e divulgando o link do vosso blog para divulgação.
Att.;
Américo Silva
americo.silva@yahoo.com.br
http://agoraeusei.net