Justiça
com as próprias mãos
O termômetro da nossa insanidade coletiva, incluindo os setores radicais
da mídia, está subindo, paralelamente à violência desbragada. Onde falta ética
e educação de qualidade, ou seja, um bom IDH (índice de desenvolvimento
humano), sobra a marcha tribal da insensatez. Em ano eleitoral, é de se
imaginar que o clima quente da reação emotiva contra a violência, tal qual o do
verão, vai bem longe. O Brasil continua na contramão da história civilizatória.
Está chegando a conta dos 514 anos de colonialismo teocrático (herança
maldita), autoritarismo (arquétipo do Pai), parasitismo dos dominadores
(escravidão, corrupção e neoescravidão), selvagerismo (violência epidêmica),
ignorantismo (3/4 da população é analfabeta ou semialfabetizada – ver Inaf) e
segregacionismo (apartheid sócio-étnico-econômico). Guerra de todos
contra todos (Hobbes), que esquenta mais ainda quando bandidos das classes de
cima passionalmente (Durkheim) se igualam à violência dos marginalizados
perversos (por meio da justiça com as próprias mãos ou dos linchamentos,
não autorizados pelo “contrato social”). De acordo com os indicadores
socioeconômicos do Brasil, há um exército de milhões de jovens sem trabalho,
sem estudo e sem estrutura familiar ou social solidificada (nem, nem, nem). São
rejeitados por todos, até mesmo pela “ralé”, que é a classe D.
Nosso estágio de desigualdade socioeconômica (a melhora dos últimos anos
foi totalmente insuficiente) e de degeneração moral coletiva chegou ao fundo do
poço. Enquanto não rompermos a herança maldita da nossa estúpida, corrupta e
violenta colonização, não vamos nunca sair desse atoleiro sanguinário e
parasitário comandado pelas elites burguesas do capitalismo extrativista e
selvagem. Só existe um caminho para a ruptura: ética e educação de qualidade
para todos, tal como fizeram, depois de muita luta do povo, os países do
elogiável capitalismo evoluído e distributivo (Dinamarca, Noruega, Suécia,
Japão, Coreia do Sul etc.).
Educação civilizatória obrigatória, em período integral, promovendo-se
assim, finalmente, nossa primeira grande revolução! Temos todos, ricos e
pobres, o dever imperativo categórico (Kant) de levantar essa bandeira. Os 47
países com melhores IDH do mundo têm 1,8 assassinatos para cada 100 mil
pessoas. O Brasil, com IDH ridículo para sua riqueza, é o 16º país mais
violento do planeta, com 27,1 assassinatos, por 100 mil habitantes, em 2011.
Enquanto não radicalizarmos no sentido da educação universal e da melhora
substancial da renda per capita do povo que trabalha duramente, só resta ir
contabilizando os “cadáveres antecipados”, a ira, o ódio, a insatisfação e a
indignação massiva (que são os ingredientes de uma estrondosa revolução que
ainda não ocorreu).
(Publicado pelo jurista e professor Luiz Flávio Gomes em JusBrasil
em 09/02/14)
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