quinta-feira, 31 de julho de 2014

CABE OU NÃO A CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE AVISO PRÉVIO INDENIZADO?

Indagada por um interessado leitor sobre a incidência da quota previdenciária sobre o aviso prévio indenizado, resolvi destacar a matéria que, provavelmente, será dúvida de muitos.
O Decreto 3048/99, que regulamenta a Previdência Social, em seu art.214, que especifica o que compõe o salário de contribuição, em sua redação original, destacava, em seu  § 9º, as exceções, ou seja, o que não entrava no cômputo e, no  inciso V, alínea “f”,  apontava o aviso prévio. Assim, durante um tempo o aviso prévio não sofreu a incidência da previdência., por expressa determinação legal.

Mas o Decreto número 6.727 de 2009, revogou expressamente a alínea f inciso V parágrafo 9º do artigo 214 do Decreto nº 3.048/99, mais conhecido como Regulamento da Previdência Social, que excluía da base de cálculo da contribuição previdenciária o aviso prévio indenizado.

Ou seja, com essa mudança, essa parcela passaria a integrar a base de cálculo da contribuição.

Por conta dessas mudanças muita celeuma se estabeleceu e os julgadores passaram a divergir entre si a respeito dessa incidência.

Enquanto alguns aceitavam a mudança simplesmente e optavam pela cômoda aceitação da tributação, outros entendiam que a lei que criou a obrigação não poderia ser superada por decreto posterior, e que, portanto, deveria permanecer a não incidência da contribuição, mesmo após a publicação desse Decreto 6727/2009, até porque seria inconstitucional aquele decreto, pois a Constituição Federal em seu artigo 150 veda à União exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.

Alguns entendiam dessa forma porque, inclusive,  a lei 9.528/97, (que não foi revogada, e que alterou alguns dispositivos das Leis 8212 e 8213 de 1991, que regem as questões previdenciárias),  estabelece no art. 28, I, em relação ao empregado e ao trabalhador avulso, que o salário de contribuição  do empregado e do trabalhador avulso, compreende a remuneração recebida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade de rendimentos pagos, destinados a retribuir o trabalho. Logo, se o aviso prévio é indenizado e não retribui o trabalho, não pode ser tributado.

Mesmo assim, alguns Tribunais Superiores entenderam que o aviso prévio, mesmo indenizado, faz parte do tempo de serviço do trabalhador para todos os efeitos legais, como estabelecido pela parte final do parágrafo 1º do artigo 487 da CLT, e que seria consequência lógica a incidência dessa parcela.

Como é fácil de se ver, a ineficiência dos nossos legisladores sempre deixa lacunas e é justamente dessas brechas que o Estado, os advogados e alguns operadores de direito  em geral  e, neste caso, a Previdência,  se utilizam para se beneficiarem de alguma forma.

É certo que, após a repetição de vários julgados,  a dúvida acabará sendo dissipada com o tempo, mas, enquanto isso, os empregadores sofrem com a insegurança jurídica.

Devo destacar que hoje, o STJ consolidou o entendimento de que o valor pago ao trabalhador a título de aviso prévio indenizado, por não se destinar a retribuir o trabalho e possuir cunho indenizatório, não está sujeito à incidência da contribuição previdenciária sobre a folha de salários. (Neste sentido AgRg no REsp 1220119/RS, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Segunda Turma, julgado em 22/11/2011, DJe 29/11/2011).

Também o Tribunal Superior do Trabalho (TST) entende que não há cobrança de tributo sobre qualquer parcela indenizatória. Há inúmeras decisões unânimes sobre a não incidência de INSS sobre o aviso prévio indenizado e nem sobre o 13º salário indenizado, entendendo os Ministros da Suprema Corte Trabalhista de que o aviso prévio não é parte do salário de contribuição.

            Destaco, abaixo, posicionamento recente do TST, no sentido de que: NÃO HÁ INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE AVISO-PRÉVIO INDENIZADO (Processo: RR-1087500-12.2007.5.11.0002)
A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho afastou a incidência da contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de aviso-prévio indenizado, ao julgar a ação de um vigilante que prestou serviços a um município. A decisão reformou entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR), para quem o aviso-prévio, mesmo indenizado, integra o tempo de serviço para todos os efeitos legais.

O desembargador convocado João Pedro Silvestrin, relator do processo, destacou que o aviso-prévio indenizado, por não se destinar a retribuir trabalho nem a remunerar tempo à disposição do empregador, não se sujeita à incidência da contribuição previdenciária, e em sua fundamentação, citou diversas decisões do TST com o mesmo entendimento.  Além de indicar jurisprudência do Tribunal ao dar provimento ao recurso de revista do município, João Pedro Silvestrin também registrou uma análise sobre a questão feita pelo ministro João Orestes Dalazen, para quem o aviso-prévio indenizado é uma "indenização pelo serviço não prestado".

Concluo que,  embora ainda não haja um consenso a respeito, na condição de juíza do trabalho e pessoalmente, entendo ser absolutamente indevida a contribuição sobre o aviso prévio indenizado. Primeiramente pela inconstitucionalidade do decreto, e em segundo lugar por implicar em perdas para o trabalhador e para o empregado, na medida em que ambos pagam pela contribuição indevida.

Além disso, o empregado que está recebendo uma indenização pela perda do emprego ainda tem que contribuir com parte de sua recompensa para o governo na forma de tributo, e, se obtiver outro emprego no mesmo mês, a previdência não computará os dois recolhimentos para sua aposentadoria.


Assim, seja pela inconstitucionalidade, seja pela inalterabilidade da natureza da verba do aviso prévio em sua modalidade indenizada, entendo que é incabível a norma exarada pelo decreto nº 6.727/09,  não cabendo, portanto, contribuição previdenciária sobre o mesmo,  embora ressalte que ainda existem alguns entendimentos no sentido contrário. Tanto o é que o seu reflexo sobre o 13º salário assim como sobre as férias indenizadas, segundo a própria legislação previdenciária, não devem ser considerados como salário de contribuição.

2 comentários:

  1. Linda Brandão, bom dia!
    Admiro as notas publicadas em seu blog. Se possível, gostaria de trocar e-mail: efrain@musician.org
    Quanto a incidência da contribuição previdenciária sobre o aviso prévio, o assunto de fato é polêmico.
    A Receita Federal, responsável por fiscalizar as contribuições previdenciárias, entende e se posiciona que o recolhimento do INSS sobre o aviso indenizado é devido e a falta de recolhimento é passível de multa em caso de fiscalização.
    É comum as empresas, por não terem segurança jurídica consolidada sobre o tema, descontarem a contribuição previdenciária sobre os avisos indenizados. Isto porque estão a mercê da fiscalização da Receita Federal e não pretendem recorrer a multas e sanções no judiciário.
    Na minha opinião, levando em conta a previsão constitucional e a conceituação legal de salário de contribuição anteriormente tratada em vosso blog, entendo que o encargo previdenciário incide sobre a contraprestação auferida pelo trabalhador decorrente do exercício regular de seu trabalho ou do tempo que esteja à disposição do empregador, no curso de uma relação empregatícia ou de trabalho. O aviso, na sua forma meramente indenizatória, não representa contraprestação por trabalho executado tampouco tempo à disposição do empregador, visto que durante o período de sua projeção, considerada para fins de pagamento das demais verbas rescisórias, inexiste qualquer obrigação por parte do trabalhador em manter a prestação de serviço que existia antes do rompimento do contrato laboral.
    Entretanto, infelizmente, o entendimento acerca da matéria, conforme já dito, não é pacifico.
    A RFB, não obstante o entendimento exposto, por meio da Solução de Consulta nº 15/2013, a Coordenação Geral de Tributação entende que "O aviso prévio indenizado integra a base de cálculo para fins de incidência das contribuições sociais previdenciárias".
    Por meio da IN 925/2009, a qual dispõe, entre outras providências, sobre as informações a serem declaradas na GFIP, a RFB determinou que a partir de 12/01/2009 as pessoas jurídicas ou os contribuintes equiparados que efetuarem rescisão de contrato de trabalho de seus empregados e pagarem aviso indenizado deverão preencher o Sefip de modo que o aviso indenizado haja incidência da contribuição previdenciária.
    Diante de tais considerações, tendo em vista a controvérsia existente, não havendo interesse da empresa de oposição e defesa perante o judiciário, na minha opinião, no ponto de vista empresarial, é recomendável adotar o procedimento instruído pelo órgão fiscalizador (RFB). Por outro lado, recorrendo ao judiciário, é possível conseguir liminar na justiça autorizando a não incidência previdenciária sobre aviso indenizado.
    Obrigado.
    Abraços.

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  2. Boa noite, Efrain
    Foi um prazer ler seu comentário tão bem elaborado. Efetivamente, como disse, a questão é polêmica, haja vista a existência de hiatos em nossa legislação, de forma a ensejar dúvidas e embates entre entendimentos diversos.
    Sua abordagem, no entanto, é perfeita. Continuo entendendo, como você salientou, que não há incidência da quota previdenciária se o aviso prévio é indenizado, até pela própria natureza do mesmo. Esse enfoque, contudo, tem direção trabalhista, e já está consolidado pelo STJ e pelo TST.
    Mas a Fazenda, em nosso país representada pelo “leão”, sempre se posiciona da forma mais onerosa ao contribuinte. Por isso esse entendimento que destoa da essência mesma do aviso prévio quando indenizado e viola, sobretudo, a própria determinação constitucional relativa à tributação, pelas razões que já salientei.
    Com isso, alguns empregadores preferem não se arriscar a terem que ingressar em discussão e acabam por recolher a parcela, da qual, muitas vezes, não se beneficia o empregado pois, se obtiver emprego e auferir ganhos no mês que corresponderia ao aviso prévio, não terá as duas contribuições somadas para obtenção de um mês a mais de serviço, ou para cômputo da média de salários de contribuição.
    Enfim, dessas pequenas mazelas jurídico-políticas vai-se tecendo um imenso tapete de jurisprudência e doutrina em nosso país, dificultando a vida dos julgadores e intérpretes da lei, além, é claro, de provocar uma grande insegurança jurídica nos contribuintes, o que é lamentável.
    Obrigada pelo comentário. Atenciosamente.

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